Refugiados: Inconveniente é Não Ajudar
Antes de lerem este artigo preciso de fornecer alguma informação acerca de mim:
- Não tenho partido político e vivo numa constante esquizofrenia indecisa.
- Não tenho nenhuma religião e abomino extremismos religiosos e até mesmo práticas normaizinhas mas que não consigo compreender.
- Não vejo muitas vezes o telejornal.
- Fiz apenas voluntariado uma vez e arrependo-me todos os dias por não contribuir mais para a sociedade com o meu tempo livre.
Agora sintam-se à vontade para fecharem o separador do vosso browser ou de continuarem a ler as minhas opiniões acerca do tema.
Se
sexta-feira o assunto quente da Internet e vida real foi a recepção aos
refugiados, pressinto que hoje, segunda-feira já passou de moda. Na
minha breve passagem pelo Facebook e Instagram vejo a carneirada a dispersar. A culpa é do desfecho da silly season, do regresso às aulas, das festas de fim-de-semana e também do reality show
Sócrates. Nesta vida dupla andamos alienados do mundo real-real e
canalizamos o pensamento do nosso semelhante como nosso, sem
pesquisarmos, sem lermos, sem ouvirmos mais opiniões. Mas não
canalizamos os bons exemplos daqueles que se voluntariam ou que dizem
realmente aquilo que acham. É mais fácil assim, nesta sociedade fast em que vivemos.
Opiniões
instantâneas (ou partilhas instantâneas) seriam evitadas se existisse
um plano de estudos que incluíssem Política desde cedo. Em Portugal
simplesmente não existe e os capítulos nos livros de História sobre a
temática são muitas vezes saltados. Porque se escolhem fanaticamente
clubes desde o nascimento, criando-se cartões de sócio precoces, mas a
política continua a ser um tabu? Para muitos, dizer em quem se vota é
sacrilégio. São esses mesmos que não perguntam nem querem responder ao
salário que ganham, seja muito ou pouco (mas aposto sempre que é muito),
porque têm as noções de inconveniência trocadas. Inconveniente são os
mendigos nas ruas, a criança cigana que chora após bofetada da mãe, a
prostituta que trabalha na noite de ano novo às portas do Técnico.
Inconveniente é a degradação social que vemos de dentro e fingimos não
ver, pela qual não choramos nem fazemos partilhas em loop no Facebook.
Prioridade
é o ser humano, mantê-lo vivo e fora de ambientes precários, manter as
condições básicas: alimento, vestuário e abrigo. Mas este ser humano não
tem um rosto, não tem uma etnia, não tem uma religião: somos todos.
Sempre achei estranho as pessoas irem passar meses a outros países para
fazerem voluntariado quando aqui há tantas causas para apoiar e mesmo
que ache que se deve trabalhar e ajudar de dentro para fora também acho
que não se podem virar as costas a seres humanos que não têm nada sem
ser a própria vida, pela qual conseguiram chegar até aqui. Afinal porque
começam as guerras? Quem nos promete que isto nunca nos acontecerá a
nós, portugueses? E aí quem nos dará a mão, possibilidade de estudos e
emprego? A mão tem de ser dada não só aos refugiados mas a todo e
qualquer ser humano. Corremos riscos em ajudar, dizem muitos, mas também
corremos riscos em não fazer nada. A verdade é que há trabalhos que
aqui ninguém quer fazer, há locais no interior onde ninguém quer viver.
Para estas pessoas que fogem do terror essas tarefas e essas terras
podem ser o sonho de um recomeço. É impossível não pensar nos nossos
compatriotas que têm de perseguir o sonho para lá das nossas fronteiras
pois não encontram estabilidade e apoio aqui. Se considerarmos as
políticas de migração, que tantas vezes são discutidas, e o medo que
temos das perseguições raciais, étnicas, religiosas, compreendemos muito
bem o porquê de dar uma oportunidade a quem nada tem. O grande problema
é que apenas se ajuda quando a calamidade já nos é inconveniente.
Quando chega às nossas costas em barcos ilegais e nos faz parecer mal
perante o resto do mundo.
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