Nos Sapatos do Meu Pai

Este mês temos mais um texto da Plácida, desta vez um reflexo acerca da maneira como os pais vestem os filhos hoje em dia, muito à sua própria semelhança. Em 2011 falei um pouco sobre isso aqui e passados cinco anos vemos que é uma tendência em continuidade.

 Lookbook Zara

 “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades” nada consegue ser mais verdadeiro que isto, mas há certas mudanças e determinadas vontades mais difíceis de aceitar que outras. Sim, isto pode não ser considerada uma grande ameaça para a humanidade, mas trata-se de algo que me tem chamado a atenção, em várias ocasiões e momentos da minha vida. 

O nosso dia a dia começa e termina sempre da mesma forma - com escolhas - e podemos dizer que 90% da nossa rotina é iniciada com a resposta a esta pergunta “o que devo vestir?”. Seja porque vamos trabalhar ou porque vamos sair com os nossos amigos, visitar familiares, ou até mesmo quando ficamos em casa (“fico com o pijama ou visto outra coisa?”), é tudo uma questão de escolhas, para nós adultos. Os bebés e a maioria das crianças não tem esse poder de decisão, nem mesmo no que toca à forma como se devem vestir. Somos nós que o fazemos, pois nós, adultos, acreditamos saber quais as melhores roupas e os mais indicados estilos para eles, impingimos os nossos gostos e fazemo-los reféns do nosso estilo. Enquanto adultos pensamos ter a perfeita noção do quão confortáveis e apresentáveis eles estão, vestindo determinadas roupas. Mas não estou aqui para questionar os gostos pessoais dos pais, mas sim para questionar as escolhas de alguns designers/ grandes marcas.

Lookbook Burberry 

Quando somos crianças tentamos vestir as roupas dos nossos pais, quando calçamos os sapatos grandes, aplicamos a maquilhagem, colocamos as malas de mão enormes e cheias de coisas, que não sabemos bem para que servem… Nessa altura o nosso comportamento é visto como sendo algo adorável. Na maioria dos casos porque somos pessoas de meio metro a tentar parecer gente adulta. Sim é realmente adorável de se ver, mas é importante não esquecer que estamos a falar de crianças a tentar agir como adultos, a brincar de adultos, mas que não o ambicionam ser. Pelo menos não tão cedo, e por isso mesmo é que esses actos são adoráveis. Todavia, hoje em dia são os adultos que tentam “obrigar” as crianças a brincarem de gente grande. Talvez a minha investigação seja demasiado superficial e não tenha explorado todos os países e tendências, mas a moda infantil tem-se aproximado demasiado da moda das “pessoas crescidas” e quando digo demasiado é no sentido em que as roupas que se vêem na secção de homem/mulher é a mesma que se vê na secção de criança, mas em tamanhos mais pequenos.

Lookbook Dolce and Gabbana

O que se passa com a moda infantil? O que aconteceu aos estampados com desenhos animados, a combinações malucas de cores vivas, que antes se podiam encontrar na secção de bebés/crianças? Onde anda o design concebido a pensar nas crianças e não nos adultos? Por onde anda tudo isso? Sim, ainda lá está – nas prateleiras destinadas às meninas, onde o cor-de-rosa é a abelha rainha. Elas ainda têm o poder da infantilidade/imaturidade nas roupas, elas ainda podem escolher entre serem pequenas adultas ou adoráveis meninas. Os rapazes, bem os rapazes não tanto como em tempos puderam. 

Lookbook Mango

Mas volto a repetir, não estou aqui para julgar ninguém, apenas pretendo lançar no ar esta pergunta que me tem assaltado a mente em várias ocasiões. Alguma vez pensaram neste assunto? Pode parecer algo bastante banal, mas não é. É como se as crianças estivessem a dizer “quando eu crescer quero ser como o meu pai” e os designers de moda/pais/tutores respondessem “não precisas de esperar tanto, podes começar já hoje!”. Não me interpretem mal, não digo que o estilo adulto não deva ser criado e ajustado para as crianças. A diversidade e poder de escolha é o que todos procuramos e sou bastante a favor disso, mas por essa mesma razão deveríamos tentar manter a inocência das crianças através das roupas, para além do estilo adulto que agora se encontra nas montras das lojas. Regressar aos desenhos animados, aos estampados infantis, aos dinossauros  de várias cores e tamanhos que não devem viver apenas nos pijamas ou nas meias, mas também nos casacos, camisas, sapatos e em todas aquelas peças de meio tamanho que as crianças usam.

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