Feminismo & Música | Britney Spears

A Britney está quase, quase livre! O pai, Jamie Spears foi afastado da custódia que impôs e foi permitida, até agora, por juízes machistas, num sistema judicial incongruente. No último ano foi pública a vontade da artista de ser autónoma e sair desta tutela abusiva, sentindo-se traumatizada com a forma como foi tratada. Revelou ainda que lhe eram proibidas decisões tão pessoais como os métodos contraceptivos que utilizava, casar ou ter filhos. Dou importância ao caso da Britney porque penso: se lhe fazem isto a ela, nenhuma de nós, mulheres, está a salvo. 



Fotógrafo | Gilles Bensimon

Vou tentar fazer um resumo desta longaaa história... Britney Spears, em 2006 passava um período difícil a nível pessoal. Divorciada do pai dos dois filhos pequenos, teve de dividir a custódia deles. Constantemente perseguida por paparazzi que punham em risco a sua saúde física e mental, foi fotografada de lágrimas nos olhos, a conduzir com um dos filhos ao colo. Mais tarde contou que estava aterrada com as perseguições dos fotógrafos e não queria deixar o bebé no banco de trás, por isso preferiu agarrá-lo no seu colo. Numa noite de 2007, em que o ex-marido não permitiu a sua visita às crianças, a cantora, que tinha constantemente a companhia indesejada de fotógrafos, foi-se a baixo depois de vários pedidos para que a deixassem de perseguir. Sim, foi aqui que rapou o cabelo. Este acto, para mim, significa libertação de quem era, a menina-mulher namoradinha dos Estados Unidos da América. O desespero deste dia levou-a a atacar a viatura de um dos fotógrafos. 

Assim se marcou o início do fim da liberdade de Britney Spears, que em 2008 foi hospitalizada numa instalação psiquiátrica, depois de se ter trancado num quarto com um dos filhos pois não queria entregá-lo ao pai. Os comportamentos erráticos tinham como alegada causa o abuso de substâncias tóxicas. Mas se este abuso existiu foi devido à sua saúde mental completamente abalada e fragilizada. Foram os media, devido ao interesse do grande público (sim, temos culpa no cartório), que demonizaram a imagem da Princesa da Pop e venderam esta caricatura. No início da sua carreira tinham manipulado a sua imagem de outra forma, sexualizando-a e ao mesmo tempo infantilizando-a, criando uma imagem perturbadora mas muito comum em artistas femininas, na época.

A partir daqui, o seu pai pediu ao tribunal para ser o responsável oficial da vida pessoal e profissional da filha, indagando incapacidade psiquiátrica da mesma. Foi concedida esta tutela e a cantora continuou a trabalhar: lançava álbuns, dava concertos e fazia parte dos jurados num programa de TV. Era ela a fonte de rendimento, directa e indirecta, para centenas de pessoas. Até 2018, quando Britney desistiu da residência artística em Las Vegas. Se não estava bem para ser responsável pela sua vida, também não voltaria a pisar os palcos. Este acto foi uma mensagem bem explícita do descontentamento da estrela pop, que funcionou como um gatilho para a preocupação com a sua situação, por parte de imprensa e público.

Passados 13 anos finalmente vislumbramos o fim desta história, em grande parte devido aos fãs da intérprete de Toxic. Foram eles os impulsionadores do movimento #freebritney, partilhando nas redes sociais que algo de errado se passava com a sua musa e mostrando apoio em manifestações à porta do tribunal. Esta pressão mediática claramente influenciou a decisão dos juízes. A custódia ainda está de pé a nível financeiro, agora com tutores públicos escolhidos por Britney. Mas existe já uma petição ao tribunal para que este arranjo seja dissolvido e dia 12 de Novembro teremos uma resposta a esse pedido.

Onde entra o feminismo nesta história? Pois bem, se retiraram toda a liberdade (dentro de uma bolha de privilégio, ainda assim) a uma mulher branca, cis, rica, talentosa, famosa e adorada mundialmente... podem retirar a liberdade a qualquer Mulher. Se tornam indefesa e dependente uma artista pop, que tanto trabalhou para construir o seu Império, o que fazem com aquelas que não têm voz, em países de terceiro mundo, em cidades que as tornam invisíveis, em trabalhos onde são observadas a partir de cima com desdém... Em 2021 os direitos das mulheres ainda correm grande risco e este exemplo que falo hoje, mostra como é tão fácil um homem controlar o corpo e vida de uma mulher.

NOTA: Esta publicação continuava, dando exemplos de outros casos, de artistas homens desequilibrados psicologicamente, viciados, agressores, violadores e aos quais não foram roubados os seus futuros. Como o texto sobre o caso Britney já estava longo, resolvi dividir em várias publicações sobre Feminismo & Música. Podem também ouvir-me falar sobre este tópico no meu Podcast - Ana (Super Nervosa) Amaro.

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